domingo, 14 de outubro de 2007

Paul McCartney, Baixistas, Guitarristas Frustrados e um Momento Gafanhoto

É engraçado. Me acho razoavelmente imune às manchetes bombásticas da imprensa, que às vezes até escondem matérias interessantes e dignas abaixo de si. Mas, aprendi hoje que, se de fato tenho esse preparo, ele se restringe ao campo da política, economia e coisas do gênero. Sim, porque eu fui atraído como um urso ferido a esta reportagem sobre o velho Paul, no portal Globo.com:

Paul McCartney: o lendário baixista queria ter tocado guitarra nos Beatles“Fiquei insatisfeito quando peguei o trabalho”, diz em entrevista a Pete Doherty

Ao ler o conteúdo, me acalmei, e compreendi o que Macca quis dizer. Era o momento de decolagem dos Beatles, ele - como todo jovem músico - queria ser o "band-leader", e esse é um cargo reservado aos vocalistas e aos guitarristas, ainda hoje. Ok, depois dos Beatles houve exceções importantes, como o Police, o Rush, o Pink Floyd, o Iron Maiden etc., mas a regra geral quando se monta uma banda adolescente é: o cara mais pintoso vai pro vocal; o melhor tocador de violão, que consegue tirar uns solos, vai pra guitarra; o que toca menos violão, pro baixo; e o cara que não sabe tocar nada, mas é o mais animado da turma, vai pra bateria - principalmente se ele tem uma família cuca-fresca que deixa a banda ensaiar na garagem.

Talvez por isso a imensa maioria dos baixistas amadores que andam por aí sejam apenas guitarristas frustrados. E talvez seja por isso também que um baixista amador, mas puro-sangue, nunca fique sem emprego.

Mas voltemos ao Paul. No caso dele, havia agravantes. Tinha toda a história do Stu como baixista da banda; e o carisma de Lennon o tornava candidato natural ao posto de "band-leader".

Eu comecei a tocar violão por pura inveja de um colega do segundo grau - como diz o filósofo Roger Rocha Moreira, "não fosse por mulher eu nem era roqueiro". Mas a primeira banda, e tudo o mais que eu cresci como gente a partir daí, eu devo a um cara sensacional que já não está entre nós - e que Deus o tenha no melhor lugar, no Valhalla do Rock´n Roll, que imagino deve ser algo parecido com um Woodstock sem lama e na beira da praia.

Bom, éramos 3 ou 4 guris de 15 anos tocando violão na calçada de esquina. E tínhamos um vizinho trintão, recém-chegado no bairro, que tinha uma banda. E aí um belo dia o Zeca chegou pra nós e chamou a gente pra assistir um ensaio. E veio a oferta irrecusável:

"Ó, galera, domingo que vem a gente faz assim: a gente monta o equipamento de manhã, vocês ensaiam aí enquanto a minha galera não chega, que tal?"

Imaginem a euforia e ansiedade da gurizada. E agora, quem canta, quem toca o quê? Aí rolou um Momento Gafanhoto. O Zeca chegou pra mim e falou algo assim:

"Você vai pegar o baixo. Os outros meninos revezam na guitarra base e nos solos, mas o baixo é o mais díficil, tem que ter noção de ritmo, conversar com a bateria. Você já passou da fase de tirar só o Legião, tu já toca uma MPB, uma Bossa, então vc vai pro baixo."

Uma origem diferente, certo? O baixo é o coração da banda. Bandas ruins tem um "gordinho lá no fundo", com disse o Macca. Bandas que fazem a diferença tem um baixista de verdade, mesmo que não seja um "virtuose". Mas tem que ser consistente, tem que ser "honesto". Fuçem os seus discos e confiram. Mesmo "soterrado" por dois talentos da estatura de Bono e The Edge, Adam Clayton fez da linha de baixo de "New Years' Day" uma das melodias mais facilmente reconhecidas do U2.

No fim das contas, Paul tinha lá suas razões pra ficar chateado. Ok. Mas os Beatles certamente ganharam muito quando entregaram o baixo ao melhor músico dentre os quatro gênios que eram.

Axé!

Um comentário:

Anônimo disse...

Zé,
Esse post foi show!
Mas tira a porra da moderação!
Abraço,
Cleyton